...tomou um banho com o intuito de desapregar do corpo todo o cheiro e gosto de imundície que com ela se confundiam. Debaixo d'água via flashs dos filtros de sonhos que estampavam-se nas paredes téticas a cada farol de automóvel que passava. Não sabia decifrar as cartas enigmáticas que enviava a si mesma, então se entretia, como uma aranha a tecer uma teia, em seus mistérios, míticos, profícuos e etéreos. Perdida e encantada no labirinto de suas cores, passava horas e horas sem querer voltar... somente quando o encanto tornava-se rude e irônico é que ela percebia sua perdição e buscava em desespero a saída, que em seu imaginário seria vislumbrada a partir de um encontro doloroso com a verdade. Tinha por estratégia marcar o caminho percorrido com cacos de espelho, onde por vezes, inutilmente, tentava encontrar sua imagem e ao mirar-se tudo o que via não passava do reflexo antigo de um caleidoscópio embaçado. Cansada de buscar em si o caminho, pede com orgulho ferido o fio de Ariadne e não sem trabalho, consegue finalmente, sair de sua construção arquitetônica. Como de práxis sem alegações convincentes, ou melhor, sem nenhuma alegação, desmarca o encontro com a verdade e procura um repouso no balanço de um jardim secreto. Ali sentada passa a ouvir a vida como uma serena e desordenada canção. Ela carregava saquinhos de psicologia no bolso e ás vezes plantava essas sementes de soluções para vida alheia... e regava o solo com água imantada de certezas, depois observava paciente a rebentação dos primeiros brotos cor de verde-esperança-desbotado cobrindo o marron-vermelho da terra. Na hora da colheita ela vivia um (des)contentamento febril que descia pelo corpo inteiro em forma de gotas de suor gelado. Sabia desde sempre que não havia chá pra suas mazelas, aí se enganava docemente com mel e cogumelos que brotavam ao nascer do sol nas póstumas ruminações das vacas, que sabiamente na India são sagradas... outra vez ela mergulha em suas cores e dores eternamente num recomeço que não se repete.
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